UM PEQUENO PASSO PARA A HUMANIDADE, UM GRANDE PASSO PARA A BARCA


Ao que tudo indica, Ponte da Barca, palco da arquitectura popular de toda a espécie e geração, foi a terra escolhida pela Escola Superior das Artes de Coimbra (antiga ARCA) para acolher o curso de estudos avançados em arquitetura popular que se realiza no próximo ano lectivo.
Estão ainda em estudo as unidades curriculares do curso, que serão discutidas entre a instituição de ensino e o município, havendo um interesse local para utilizar exemplos da arquitetura popular barquense como casos de estudo.


Sendo a arquitectura popular um universo que contem cada vez mais tipos de manifestações arquitectónicas, será vago imaginar que esta pós graduação de dois semestres englobe todas as tipologias e tempos da arquitectura popular. Pessoalmente, gostava que este curso não se afunilasse para a temática da arquitetura tradicional, deixando de parte as novas praticas arquitetónicas ligadas aos novos materiais, às influencias externas e à autoconstrução. Apesar de reconhecer a qualidade da arquitetura tradicional do nosso meio, quer pelo profundo conhecimento dos materiais e da forma como os trabalhar, quer da qualidade compositiva das soluções e da forte ligação entre forma e uso, acho que são estudos que não vem acrescentar muito ao que já se debate desde os anos 30.
Já em 1935, em Itália, Giuseppe Pagano defendia que a arquitetura vernácula deveria ser usada como um instrumento de desintoxicação. Segundo Pagano, onde a cultura do século XIX via só arcádia e folclore, a análise deste grande repositório de energia que sempre existiu como mero pano de fundo, pode dar-nos a alegria de descobrir expressões de honestidade, clareza, lógica, e longevidade.” 
Hoje, quase um século depois, após uma série de estudos no território português em que se destaca o "Inquérito à Arquitectura Popular em Portugal", parece que as premissas e os objectivos de estudar o repositório arquitectónico tradicional se mantém pouco alterados.
Se o olhar sobre estas matérias não for aprofundado, corremos o risco de não sair do campo da nostalgia, e cair nas politicas de "recuperar fachadas" que já são uma realidade, procurando imitar soluções do passado em vez de compreender soluções e actualiza-las. A arquitectura tem de ser mais que um "pano de fundo" para atrair turismo.

O meu medo é que isto da arquitectura acabe como os ranchos. Apesar de serem um excelente pretexto de interacção e integração do indivíduo nas comunidades pós-rurais, não deixam de ser um fenómeno que se centra na cristalização e preservação, através de trajes à "moda antiga" refeitos este ano, que não produzem cultura nova, e que são por isso opostos à evolução. Portugal precisa que as pessoas se mantenham no interior e as sociedades pós rurais que ainda vivem em lugares do interior como a Ermida, precisam de mais que um traje minhoto e uma Aldeia de Portugal tipo Portugal dos pequenitos "à moda antiga".

Espero que esta pós graduação seja um passo dado no sentido da compreensão dos novos meios, das novas estruturas dos povoamentos, dos novos modos de construir e habitar e que contribua para um novo olhar sobre as construções, não apenas da comunidade erudita, mas de toda a população. Como é que isso se faz? É isso que se terá de descobrir.